quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Globalização : face contemporânea do mundo capitalista



Por globalização entende-se um processo de internacionalização do mundo capitalista em  uma escala sem precedente, onde a expansão técnica, principalmente as da tecnologia da informação,  permitiram a criação de um mercado global cuja maior característica é a convergência do tempo no sentido da simultaneidade  das ações.

Esta fase de mundialização do capitalismo traz consequências diretas para o viver cotidiano, sendo   a mais evidente delas a velocidade de transformação da sociedade nos seus diversos níveis: econômicos, culturais, sociais e políticos. É de fato um tempo de transformação acelerada, mas extremamente confusa. Muito disso se deve as constantes distorções  que são criadas para que as rodadas de lucratividade em escala global assumam um caráter de legitimidade, fazendo de seus resíduos, não um ponto chave de contestação, mas sim de passividade e aceitação como “mal necessário”.

Tem-se então uma noção ideológica, romantizada da globalização em que o mundo estaria mais unido, rumo a uma cidadania universal , o Estado perde seu  papel  fundamental como agente regulador da economia e dos serviços essenciais ,o mercado de finanças tornou-se o mais novo bastião da acumulação de capital independente da natureza econômica e política de suas práticas e organiza-se um culto ao consumo como forma de garantia de identidade.

Estes elementos mascaram situações reais que se desenvolvem e amadurecem conjuntamente com a forma mundializada do mercado capitalista, tais como: O desemprego, variável crônica que persiste,  aumento da pobreza, redução dos salários médios, problemas em oferecer serviços públicos essenciais de qualidade a população e intensificação de padrões competitivos tanto em escala interpessoal como em escala corporativa.

A perversidade sistêmica  apresentada, faz  com que as pessoas sintam-se desamparadas , a noção de bem público e solidariedade se esvaem , O estado diminuído em suas funções sociais contribui para a ampliação da pobreza e as empresas cada vez mais ampliam seu papel político na regulação da vida social.Informação e dinheiro, tornam-se fatores ideológicos para ação global, são eles os pilares que sustentam o padrão competitivo entre as empresas, pois a produção contemporânea  ocorre em nível planetário e a busca por melhores opções leva-as a produzir dois efeitos: primeiro é o incremento constante de progresso técnico e segundo a flexibilização das leis trabalhistas, bem como nas formas e condições de trabalho.

 As consequências dessa atividade nas relações interpessoais são diversas, mas podemos citar tanto a competitividade que assola e retira das pessoas a compaixão, fazendo com que cada vez mais apoiem  os apelos à medidas de força,  como também ao individualismo marcado pelo consumo. Bombardeados pela propaganda, as pessoas assumem necessidades a priori, e cada vez mais contribuem para um processo de uniformização de padrões  de comportamento.

Terceirização : engodo jurídico





A terceirização, vista como intermediação de mão de obra com finalidade de corte de custos, tem sido a maior fonte de problemas no que diz respeito ao Direito Trabalhista, posto que este não utiliza de mecanismos eficazes  para responder à altura os entreveros que esta modalidade traz consigo. Vejamos que o verdadeiro significado e objetivo da terceirização é a realização de uma atividade X, de forma independente por uma empresa especializada. Logo, não pode ser confundida com fornecimento de mão de obra, não devendo ser tratado como um "objeto", patrimônio da empresa.

Entretanto, a confusão entre Terceirização e Fornecimento de mão de obra fez com que de início, todas as formas de terceirização fossem tratadas como ilícitas. Historicamente, o código civil de 1916 previa a locação de serviços, esta é a primeira previsão legal que trazia regras sobre o contrato de trabalho terceirizado, tendo sido revogado o texto lei na parte que se refere ao trabalho realizado pela empresa contratada de forma subordinada pelo contratante.

Na Consolidação das Leis do Trabalho de 1947 (CLT),  apenas o artigo 455 tratava da terceirização, mas como forma de empreitada (a contratação de um determinado serviço , a ser realizado num período de tempo pré-estipulado, por empresa ou profissional contratado). Porém, este dispositivo acabou tratando mais sobre a quarteirização, ou terceirização solidária, do que necessariamente ao processo de Terceirização, o quê acaba complicando ainda mais a conceituação desta modalidade. 

Observemos que o primeiro dispositivo legal que tratou necessariamente da terceirização direta foi o decreto-lei nº 200/67-MF,  o qual vigora até os dias de hoje. Este  trata da descentralização do serviço publico, onde as atividades executivas em que houvesse empresa privada especializada na execução das tarefas originalmente realizadas pela administração pública, poderiam ser realizadas pelo setor privado de forma plenamente autônoma, cabendo ao poder publico somente o planejamento, coordenação, supervisão e controle.

Por conseguinte, a lei 6.019, resolução de 1988 do Código Civil,  trata do fornecimento de mão de obra temporária. As empresas podem a partir dessa lei, contratar de uma empresa especializada em trabalho temporário, trabalhadores para serem inseridos em suas atividades normais, desde que haja justificativa para esta contratação.

O Direito trabalhista tem se posicionado a respeito disto de forma a apagar os focos de incêndio, em vez de realizar uma função preventiva que impeça a má utilização da Terceirização. Desta forma, a terceirização acaba trazendo consigo o título pejorativo de "merchandising", ou seja, uma forma atrativa de aumentar os lucros da empresa através do empregado, e de sua força de trabalho.

Com este breve histórico, nota-se que a doutrina jurídica sempre criticou o aluguel das empresas por trabalho humano, considerando como de efeitos deletérios pela sua própria natureza. Com o passar do tempo, houve uma  mudança na compreensão do sentido de Terceirização, caracterizando-se de forma a adotar-se uma série de medidas mais permissivas à esta modalidade de trabalho,  

A jurisprudência de nº 256, gerada pelo Tribunal Superior do Trabalho, trazia em seu bojo, a ideia de que a Terceirização seria permitida nos casos onde fosse expressamente necessário o uso de mão de obra temporária, e também os casos de contratos de serviços de vigilância, demonstrando a fragilidade do sistema de Terceirização, no sentido de garantir segurança e estabilidade aos seus trabalhadores.

Rodrigo de Lacerda Carelli cita três passos importantes para uma possível humanização da terceirização, citadas: Responsabilidade solidária da tomadora de mão-de-obra pelas obrigações trabalhistas referentes aos trabalhadores das empresas terceirizadas,Isonomia de direitos e benefícios dos trabalhadores da empresa principal e daqueles das empresas subcontratadas, caso sejam superiores,a  possibilidade de sindicalização pelo sindicato da categoria dos trabalhadores da empresa principal.

É importante concluir que a terceirização chegou a um nível de desumanização, tal que o trabalhador se tornou uma moeda de troca nos contratos, em casos que chegam a tratá-los como "cortesia" pelo fornecimento de equipamentos técnicos. Ora, isso seria o supra-sumo da mercantilização do trabalho. Isso, comparativamente, seria o equivalente a um trabalhador ser utilizado como objeto, e o objeto, como instrumento principal de contrato.

Raio X da Teleatividade

A expansão do setor de teleatendimento no Brasil esteve relacionada com o processo de reestruturação global da economia mundial, em que as tecnologias da informação representaram, junto com a concorrência, um novo modelo de acumulação capitalista. A partir da década de 1990, a digitalização de serviços e procedimentos burocráticos, por meio do desenvolvimento de softwares e hardwares mais sofisticados e as privatizações da rede de telecomunicações, permitindo um avanço do setor privado na área, permitiu com que a prestação de serviço em que se relacionam, ferramentas informacionais e comunicações, ou seja, o telemarketing avançasse no país.

No final do século XX, a informatização das centrais de telemarketing permitiu não só otimizar o tempo de atendimento e aumentar a produtividade, mas também reduzir os custos com força de trabalho, substituindo “trabalhadores de carne e osso” por “atendentes virtuais”.( Cavaignac, p. 50) .A condição tecnológica estabelecida como paradigma econômico reorganiza o mundo do trabalho e nos força a analisar as centrais de telemarketing, uma vez que são formas legítimas de organização empresarial sob os moldes da informatização.


De forma geral, percebe-se uma grande rotatividade dos trabalhadores de teleatendimento, sendo que 72% deles tem menos de oitos ano de atuação, distribuídos em áreas como o varejo, serviços financeiros, principalmente os bancos , e telecomunicações. ( Diaz, pág. 49) . Mesmo com essas características, percebe-se que o setor cresce em escala considerável, demonstrando ser um dos setores mais dinâmicos de empregabilidade dos grandes centros urbanos brasileiros. A título de exemplo, as Posições de Atendimento (Pas) relativos ao “Atendimento ao consumidor” explodem de 27 para 13.673 em apenas três anos, ( 2003-2006) (Diaz, pág. 50) ,demonstrando tanto a ampliação deste nicho de mercado como sua relação direta com a norma jurídica, estabelecida pelo direito do consumidor, que reconhece o teleatendimento como recurso possível de mediação entre o consumidor e a empresa.

As centrais de Teleatendimento, oferecem dois tipos de serviço: o atendimento receptivo, aquele no qual o cliente toma iniciativa, com objetivos de resolver seu problema específico e a abordagem ativa em que a empresa toma iniciativa e entra em contato com consumidores ou futuros consumidores. Diversos são os serviços que se adequaram a postura receptiva/ativa da teleatividade como, resolução de problemas decorrentes da prestação de serviços,encerramento de contas, serviços de cobrança, venda de pacotes de serviços promocionais a clientes e possíveis clientes entre outras funções. A maleabilidade de serviços combinadas com as estratégias de redução de custos, incentivam as empregas a terceirizarem seus serviços de acordo com seus interesses e atividades especifícas.

A estrutura organizacional de uma empresa de teleatendimento, varia de acordo com seu tamanho, mas em média assume um formato de um gerente para 20 supervisores e um supervisor para 20 funcionários. A relação entre cargo de trabalho e formação educacional é evidente, vê-se que 66% dos gerentes fizeram pós graduação ou possuem curso superior, enquanto na base empresarial, apenas 22% chegaram a concluir os estudos em nível superior. Os rendimentos salariais também são gritantes, sendo que os rendimentos mensais da gerência giram em torno ( média) de R$4.891 reais, enquanto o dos teleoperadores, na média de um a dois salários mínimos. ( Diaz, pág. 51)
A baixa remuneração e a baixa exigência de escolaridade para atender as funções do teleatendimento, faz com que a profissão seja ocupada por indivíduos jovens de 16 a 29 anos, na maioria do sexo feminino, elemento que carece de atenção e maior aprofundamento, pois as mulheres que avançam no mercado de trabalho informacional, são obrigadas a lidar não somente com as questões estruturais postas pela flexibilização do trabalho, mas com imaginários sociais, machistas, que transcendem temporalmente as condições expostas na sociedade contemporânea. 

"A acentuada participação feminina no mundo do trabalho, conforme observa Nogueira (2006), significa um avanço real para as mulheres, mas esta participação tem sido marcada pela precariedade, principalmente quando se trata de remuneração. De acordo com a autora, as mulheres, quando comparadas aos homens, são predominantes nos setores de atividade com maior instabilidade e cujos rendimentos estão estipulados em até dois salários mínimos, sobretudo nas ocupações consideradas" ( Cavaignac, p. 54)


As peculiaridades do trabalho em que se destacam o uso excessivo de computador e do telefone e o complemento de jornadas de horas extras,falta de cumprimento das leis trabalhistas e pressões psicológicas no ambiente do trabalho e o regime de metas, contribuem decisivamente para o surgimento de doenças associadas ao esforço repetitivo ( Inflamações nos tendões, dores articulares, principalmente no pescoço e coluna) e psicossomáticas ( síndrome do pânico, stress e depressão).





quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

As condições de trabalho dos Teleoperadores

O ambiente de trabalho dentro de uma central de teleatendimento  mistura diversos elementos como trabalho acelerado, pausas curtas, pressões psicológicas, constrangimentos, cobranças de toda sorte, riscos a saúde com doenças causadas por esforço repetitivo ou mesmo psicossomáticas como síndromes do pânico, stress ou mesmo depressão.  Tais condições, revelam que a produção tecnológica possui duas facetas no mundo capitalista, pois ao mesmo tempo que pode ou poderia reduzir  esforço humano – e por consequência o ritmo de trabalho- é também um instrumento de exploração, fazendo dos “trabalhadores informacionais”  símbolos de uma nova era de trabalhadores precários.

“Nós somos muito cobrados diariamente. (...) É uma ligação atrás da outra, causando algumas doenças no nosso dia-a-dia: doença na garganta, problemas na coluna, tendinite é uma coisa constante. (...) Mas o operador não pode, de maneira nenhuma, colocar um atestado médico, porque é passado para ele pelo supervisor que, se ele colocar atestado, vai gerar uma coisa chamada absenteísmo, e com isso uma futura demissão. Eu já me sujeitei a trabalhar mesmo doente, até que a supervisora viu que eu estava passando mal e eu fui liberado, mas isso gerou constrangimento. (...) A gente trabalha seis horas e quinze minutos e, por lei, não é dado vale-refeição. No caso, eles oferecem um lanche. A gente recebe um cartão com direito a 14 pontos; digita a senha numa máquina que só dá direito a um refrigerante e um salgado congelado, que a gente precisa esquentar, e às vezes ocasiona um mal-estar. (...) (PH, operador de telemarketing). “ ( Cavaignac, p. 52)


O supervisor às vezes não deixa o cara ir ao banheiro. Se ele quer ir ao banheiro, ele tem que levantar a mão, chamar o supervisor; o supervisor vem, ele diz que precisa ir ao banheiro, explica, muitas vezes, o que é que vai fazer no banheiro, se vai demorar muito tempo ou se não. O supervisor tem que ficar na posição dele (operador) atendendo, para que aquele cara não comprometa o resultado da supervisão. [...] “ ( Cavaignac, p.52)

Através destes breves relatos percebe-se como a situação de trabalho pode chegar a situações degradantes, constrangedoras em que a saúde e  o próprio emprego do trabalhador  é constantemente ameaçada por modelos de organização do trabalho informacional que estão diretamente inclinados para realização de lucros por parte das empresas, fazendo de seus funcionários meros custos econômicos.  O constrangimento  das necessidades fisiológicas  em prol de uma eficiência sistêmica revela o grau de desumanização dentro das centrais de teleatendimento.

Do lado do trabalhador a visão da empresa é bem diferente. O teleoperador fica mais de 80% do seu horário de trabalho em frente a um computador, sentado e com fone de ouvido, sem poder fazer nada além do que atender as ligações, caso contrário este pode ser punido com advertências e até mesmo ameaçado pelo seu supervisor de ser demitido caso não cumpra com o rígido contrato que lhe é imposto. Ou seja, o tempo de trabalho não é um tempo minimamente livre para conseguir conversar, por exemplo, com um colega ao lado do seu atendimento, para que assim a empresa consiga acumular cada vez mais capital com suas metas intensas e difíceis de serem cumpridas .



Para que as empresas consigam acumular cada vez mais capital, fazem de tudo para os atendentes consigam atender cada vez mais com um menor numero de tempo no atendimento, montando, por exemplo, script e fluxograma de atendimento (idem p. 196), fazendo com que o atendimento seja padronizado e robotizado, mantendo sempre o mesmo tom de voz do teleoperador, mesmo que o cliente aja com agressividade e isto de deixe estressado, fazendo assim com que o operador tenha sempre um tom de gentil para que não se prolongue o atendimento.

Sendo um espaço de trabalho tipicamente preenchido por jovens, as centrais de telemarketing  camuflam, com o discurso da diminuição do emprego estrutural, fruto das condições de mundialização do capital,  o projeto de flexibilização do trabalho, pois o “perfil jovem” torna-se uma condição econômica conveniente para o empregador: Mão de obra desqualificada e barata, disposta a assumir riscos, com uma bagagem energética maior para atender  os ritmos acelerados das metas impostas, disposto a trabalhar em horários alternativos ao dito “comercial”. Ou seja, toda a maleabilidade característica da juventude vem sendo cooptada de forma a garantir os interesses vitais de lucratividade das empresas de teleatendimentos.

O atrativo serviço de  “atendimento 24 horas” que chega aos olhos do consumidor não é capaz de revelar a real condição de manutenção desse sistema, que é sustentada por uma rede de operadores informacionais, precarizados  por escalas de trabalhos e horários flexíveis , fazendo com que o tempo livre dos trabalhadores seja prejudicado por desajustes em relação aos demais trabalhadores “convencionais”.

Deve-se salientar que menos de dois anos de trabalho na empresa – tempo em que a maior parte dos pesquisados está ou esteve empregada – é tempo suficiente para por em risco a saúde dos atendentes. Uma das trabalhadoras enfatiza: “Os problemas são vários e simultâneos. Não caberiam no espaço”. E justifica por que continua trabalhando na empresa: “Só não saio porque preciso, como muitos que trabalham aqui”.  ( Cavaignac, p. 62)

As duras condições de trabalho aos quais os teleoperadores estão expostos revela  não só a agressividade do modelo de organização empresarial  mas também a alta rotatividade com que se apresenta os postos de trabalho neste setor. Os maiores motivos, são os baixos salários, a degradação da saúde física e mental  e os constantes constrangimentos nos  quais os funcionários  são obrigados a passar.
Ao mesmo tempo, verifica-se uma baixa atividade sindical da categoria. A maioria dos trabalhadores do telemarketing veem nos sindicatos estruturas burocráticas que não representam de fato seus interesses. Por consequência, observa-se não só a dificuldade de organização política que o trabalhador informacional tem, mas também uma crise de modelos representativos, sendo o sindicato a materialização institucional desta crise.  


O trabalho dentro das centrais de telemarketing mostra-se como um evento degradante em termos de qualidade de trabalho  e percebe-se também que é muitas vezes um horizonte temporário para a juventude que almeja melhores condições de vida e por isso assume todos os critérios ditos Flexíveis.

quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

Terceirização das Centrais de Teleatendimento


Com as transformações ocorridas nas relações de trabalho principalmente a partir da década de 70, impulsionadas pelo desenvolvimento tecnológico e pela constante e crescente busca por lucro através do mercado, a flexibilização do trabalho se mostra como tendência na organização do espaço produtivo, nas funções e atribuições do trabalhador, nos salários e nas jornadas de trabalho, gerando liberdade no controle de todo processo gerencial e trabalhista ao empregador, porém incerteza e insegurança ao empregado.

Na década de 90, o processo de flexibilização se intensificou a partir de uma série de modificações na legislação, entre elas pode-se citar: o trabalho em tempo parcial, uso de banco de horas, liberação do trabalho aos domingos. Vale ressaltar que outras medidas como uso de horas extras, compra de férias, redução dos salários e da duração da jornada de trabalho e trabalho em turnos noturno e diurno já estavam em vigor e foram incorporadas pelas Centrais de Teleatendimento (CTAs). (CARDOSO, 2009)

Logo, a principal evidência da flexibilização do trabalho e suas consequências talvez esteja no atual cenário de expansão e precarização vivenciada nas CTAs espalhadas pelo Brasil. Com isso, o tema e especialmente o setor de teleatendimento, vem se tornando objeto de estudo no meio acadêmico.

Através do uso de novas tecnologias nos serviços de teleatendimento, padronizou-se as operações em um processo que tornou as tarefas do teleoperador mais genéricas e o trabalhador, consequentemente, mais facilmente dispensável. O teleatendimento e a eletrônica presente desencadearam também o desemprego através da substituição dos atendimentos pessoais. Um exemplo é o atendimento eletrônico, por meio do uso das máquinas que executam grande parte das tarefas no atendimento, eliminando e enxugando o trabalho humano, necessário apenas em casos especiais. Sem a intermediação humana, esses equipamentos possuem acesso a todas informações sobre o cliente. São realizados por máquinas que “atendem” todas as chamadas, sem a necessidade de intervenção do operador.

As rápidas mudanças tecnológicas também desincentivam o treinamento do operador, visto que o todo esforço e gasto no aprendizado do funcionamento de um novo software pode ser perdido com uma atualização meses depois.

 Como parte das medidas que objetivavam a otimização dos custos, a especialização e a eficácia no aumento da produtividade, temos a terceirização, presente desde a década de 1970, de parte da produção das empresas. Essa medida atinge a maior parte das CTAs das empresas de diversos segmentos: vendas, cobrança, reclamações, serviço de atendimento ao cliente (SAC), pesquisas de qualidade, atualização de cadastros, marketing político, entre outras.

Dentro do contexto das CTAs, e especialmente nas terceirizadas, pode-se observar diversas evidências da flexibilização do trabalho. No que se refere à atividade do teleoperador, destaca-se o deslocamento constante dos atendentes para outras equipes ou produtos, afim de atender as exigências da empresa contratante e as especificidades do mercado. Esse realocamento causa, por diversas vezes, a intensificação do trabalho, uma vez que o operador terá que se adaptar a novos produtos, novos scripts e nova equipe de trabalho.

Outra forma de flexibilização importante se dá na remuneração variável do teleoperador, vinculada na esmagadora maioria das vezes ao cumprimento de metas difíceis de serem alcançadas, causando enorme desgaste físico e psicológico no empregado.

Além desses já citados, temos também a flexibilização da jornada de trabalho, embora a legislação determine o tempo máximo de 36 horas semanais em no máximo 6 dias por semana, as empresas encontram maneiras de adaptar a jornada do trabalhador afim de atender a um fluxo específico de produção. Dessa forma, muitos teleoperadores tem seus horários de trabalho mudados constantemente, ocasionando, mais uma vez transtornos para o empregado se adaptar e reorganizar à nova rotina de atividades, afetando também sua formação escolar.

Embora os teleoperadores reconheçam as inúmeras explorações que estão submetidos, estes muitas vezes enxergam nas CTAs uma oportunidade temporária, incerta, ou para o primeiro emprego, dado os altos níveis de rotatividade do setor. Uma maneira de melhorar as condições de trabalho desses teleoperadores seria uma organização de classe através de um sindicato. No entanto, por se tratar de uma categoria relativamente nova e com alta rotatividade, há uma indefinição quanto ao sindicato (Sintratel/SP ou Sintetel/SP) que representa os interesses coletivos nas CTAs. O primeiro importante passo para organização da categoria em busca de melhores condições seria a solução dessa indefinição.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Considerações finais



 A flexibilização do trabalho no mundo do telemarketing é de fato um vasto campo a ser explorado pelas ciências sociais e aplicadas, pois ainda oferece uma série de desafios de compreensão de sua plena inserção no mundo do trabalho. O que pode ser apontado é sua íntima relação com os movimentos estruturais do capitalismo contemporâneo em que competitividade e tecnologia, principalmente as informacionais, garantem novas rodadas de lucratividade e por consequência organizam nichos de mercado em que o "trabalhador virtual" se enquadra. 


As condições de trabalho em que se encontram os operadores de teleatendimento, são precárias e descritas no trabalho, de forma panorâmica. Em síntese, elencou-se a jornada de trabalho flexível, em torno de 6 horas, mas extensível em forma de horas extras ou banco de horas ou mesmo em "horários alternativos", os salários reduzidos, girando em torno de 1 a 2 salários mínimos, exposição a doenças físicas ( por excesso de repetição) ou psicossomáticas como stress, depressão ou mesmo síndrome do pânico. O constrangimento, mostrou-se como uma ferramenta poderosa de coação e prática comum no ambiente de trabalho dos teleatendentes, variando desde controle sobre a movimentação interna do funcionário, chegando a casos extremos de impedimentos de realização de funções fisiológicas, como a ameaças de perda de emprego em caso de  faltas por motivos médicos. 


O perfil de trabalho, segundo critérios de faixa etária, escolaridade e sexo, demonstram que os "alvos"  são indivíduos jovens, entre 16 e 25 anos em média, com  baixo nível de escolaridade, sem experiência prévia em carteira de trabalho e predominantemente do sexo feminino. A condição precária em que se encontram  pode ser analisada segundo critérios sociológicos, pois a juventude mostrou ser um grupo disposto a arriscar mais, e aceitar condições de trabalho extenuantes e flexíveis, porém é importante ressaltar o nível de rotatividade que o cargo assume, seja pelas próprias políticas empresariais ou mesmo por inciativa do trabalhadores.  



A composição ideológica do "atendimento 24 horas", expõe as chagas do modelo de organização dos atendentes de telemarketing, pois para atender o desejo de consumo dos consumidores e ao mesmo tempo vencer a concorrência entre empresas rivais, abre-se espaço para um nicho de mercado dentro do ambiente do teleatendimento, que é o trabalho por escalas ou mesmo horários flexíveis, que muitas vezes desorganiza o tempo livre dos trabalhadores, estendendo o mundo do trabalho para áreas aparentemente isoladas dele. 



Se não bastasse todas as condições de exploração e precarização do trabalhador informacional, tem-se muitas vezes o processo de terceirização em empresas de telemarketing, fazendo com que dois funcionários de teleatendimento, com funções similares, mas um terceirizado e outro não, ganhem salários distintos e tenham direitos trabalhistas distintos. A precarização do trabalho via terceirização implica em flexibilização do trabalhador, tanto em horários como também em salários, fator de aumento de tensões entre indivíduos do mesmo setor. 

Em síntese, observa-se que o setor de telemarketing é uma das frentes do que se pode chamar de "infoproletariado" ou o trabalhador virtual contemporâneo, fruto direto junção entre ciência, tecnologia e mercado, que no mundo contemporâneo associa formas complexas e tecnológicas de organização do trabalho com métodos arcaicos de coação e disciplina do trabalhador.